A revolução por qual passa a área de saúde mental no mundo,
e especialmente em Franca, foi destaque no 3º Seminário de Saúde Mental “CAPS -
Ressignificando o Cuidado em Saúde Mental”, realizado na última quarta-feira, 19,
pela Fundação Espírita Allan Kardec, com apoio da Prefeitura de Franca, no auditório
da unidade II do Uni-Facef.
Com organização e participação dos profissionais do CAPS
(Centro de Atenção Psicossocial) III Florescer e CAPS AD (Álcool e Drogas) Renascer,
o seminário destacou a importância dessas unidades dentro da reformulação por qual
passa o atendimento em saúde mental de Franca.
Dentre os passos mais emblemáticos dessa revolução é a decisão
do Allan Kardec de não mais ter internações. O tema foi tratado pelo presidente
da Fundação, Mario Urias Martinez, na abertura do Seminário.
“Estamos encerrando a nossa atuação nas internações psiquiátricas.
Nós comunicamos este fato há alguns dias e vamos até julho. Depois, não mais
atuaremos nesta linha”, disse Martinez, fazendo questão de ressaltar de que o
Allan Kardec não fechará.
Segundo ele, 450 pessoas por mês continuarão tento
atendimento em saúde mental nos diferentes serviços prestados pela Fundação.
“Hoje, 2022, nós estamos justamente completando 100 anos de
Fundação Espírita Allan Kardec. É uma data extremamente emblemática. E é neste
contexto que a gente está fazendo este 3º Seminário de Saúde Mental. É neste
contexto que a gente está passando, talvez, por uma das maiores reformulações
que a Fundação já passou, nesses seus 100 anos. Nós estamos, praticamente, reformulando
o atendimento em saúde mental”, destacou.
Mario Martinez citou que, como parte desta mudança, houve a
implantação das Residências Terapêuticas, ondem moram pessoas que recebem
atendimento de saúde mental; as Oficinas Inspiração, que oferecem trabalho e
renda a esse público; e a instalação dos CAPSs Florescer e Renascer, em
parceria com a Prefeitura.
“Este ano, aqui em Franca, nós vamos passar por toda uma
reformulação da Saúde Mental”, reforçou a secretária municipal de Saúde, Waléria
Mascarenhas.
“Gostaria de ressaltar os trabalhos realizados pelos CAPSs
hoje, pelo trabalho que é feito lá”, completou a representante da Prefeitura no
Seminário, destacando que “diminuiu muito” o número de internações na área de saúde
mental, entre outras coisas, por causa do trabalho desenvolvido pelos CAPSs.
E é com o reforço dos CAPSs que o encerramento dos leitos
psiquiátricos se tornou possível. A coordenadora das duas unidades existentes
em Franca, Eliane Matheus Bonfante, foi a responsável por apresentar à plateia
do seminário essa trajetória revolucionante.
“Em 2018, a Fundação Allan Kardec plantou em solo francano a
primeira semente desta natureza, o Caps III Florescer. Dois anos depois, em 2020,
nova semente foi lançada à terra: o Caps AD Renascer, voltado para atendimento a
pessoas em uso de substâncias psicoativas.”
E ela narrou a recente história por meio de uma metáfora. “Se
antes desta iniciativa, o solo em que se assentaram os programas de saúde mental
no Brasil havia se tornado inóspito pela ação erosiva do arado da psiquiatra
autoritária, pela pulverização da química da indiferença e pelo adubo da
mentalidade institucionalizante, as novas sementes – os CAPSs Florescer e
Renascer – foram procurar na conhecida fertilidade do solo francano a estrutura
e a esperança para renovação de paradigmas no âmbito da saúde mental.”
São novos modelos de atendimento, adotados por uma instituição
centenária e regidos pelos valores que sempre a nortearam. “Desde cedo, o
processo germinativo dessas duas iniciativas renovadoras mostrou-nos que produziriam
árvores com as características genéticas da Fundação que a concebeu: respeito e
interesse legítimo pela saúde e bem-estar do ser humano”, ressaltou Elaine.
Segundo a coordenadora dos CAPSs, “a mentalidade dominante
em favor da internação e da exclusão social do paciente com transtorno mental,
e da medicalização com a finalidade de amortizar a individualidade cognitiva ainda
contaminam fortemente a sociedade mundial. E em Franca não é diferente”.
Em sua participação no seminário, Elaine explanou que os
CAPSs se propõem a resgatar a autonomia e a reinserção social das pessoas com
problemas relacionados a transtornos mentais.
Para isso, o atendimento se vale “das próprias estratégias que
o psiquismo dessas pessoas consiga desenvolver, com a menor interferência possível
da medicalização e só recorrendo, em último caso, a tratamento em regime de
internação. E nesse caso, em um curtíssimo período de tempo”.
“É natural imaginar, nesse cenário, que o esforço das
pessoas que lutam ao lado das ideias da Fundação Espírita Allan Kardec tenha
sido e continua sendo uma demonstração constante de resistência e valor”,
afirmou Elaine.
A psicóloga continuou afirmando que o objetivo dos CAPSs é garantir
a autonomia dos usuários. “No solo ainda contaminado pelos vestígios da psiquiatria
ancestral, não é incomum que autoridades familiares e os próprios pacientes
busquem o CAPS, esta entidade com propósitos libertadores, objetivando exatamente
o contrário da liberdade.”
São familiares e até mesmo pacientes, segundo ela, que procuram
no CAPS, não um processo de superação, mas a “clausura física” (internação) ou
da “clausura química” (medicalização).
“Desde que as sementes dos CAPSs francanos foram lançadas ao
solo, elas vêm vencendo todas as intempéries e barreiras, renascendo e florescendo
incessantemente. São psicólogos, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais,
professores de educação física, enfermeiros, médicos conduzindo oficinas terapêuticas”.
O seminário contou ainda com as mesas redondas “O cuidado
multidisciplinar na esquizofrenia” e “O cuidado multidisciplinar no transtorno
por uso de substâncias”, conduzidas e debatidas por profissionais dos CAPSs
Florescer e Renascer.